Estamos vivendo um momento de dificuldade econômica. Nós, deputados,
sabemos o quão sofrido é esse momento ao retornarmos às nossas bases. Vendo os
filhos de nossos eleitores sem emprego e seus pais sem sobras salariais para
poder acalentá-los. O momento singular que estamos vivendo exige uma reflexão.
Onde o governo do PT errou?
Creio que a história de erros da nossa república pode nos ajudar a
remontar o momento pelo qual passamos. No nosso passado assistimos a um experimento
de excesso monetário e expansão de crédito exacerbada sem lastro adequado,
criando uma bolha inflacionária que demorou mais de uma década para ser
estabilizada. O estouro da bolha foi o inicio do fim da República da Espada. O
governo atual repetiu esse erro, baixando juros artificialmente e elevando o
crédito das instituições oficiais de forma muito mais acelerada que a trajetória
do crédito privado. Vejam os resultados: os juros já tiveram que ser corrigidos
– e praticamente dobraram, subindo, a Selic, de 7,12% ao ano em janeiro de 2013
para 14,15% a.a. na última reunião do COPOM, em setembro - e o balanço do BNDES
terá que se retrair.
No final dos anos 20, tivemos uma profunda crise mundial com
consequências terríveis para os preços da principal commodity que produzíamos:
o café. Qual política pública nós tínhamos construído à época para nos proteger
da flutuação de preços? A compra de estoques in natura para preservação de um preço mínimo. Política paliativa
para excessos de oferta momentâneos, mas não para queda radical de demanda. Tal
queda de preços levou a uma escassez profunda de moeda estrangeira no
país com consequentes aumentos de preços e um empobrecimento geral da
população. Esse momento marca o fim da República Velha e trata-se da segunda
experiência brasileira no século XX de empobrecimento da população pela virada
do ciclo das commodities. No norte do país, o ciclo da borracha havia encerrado
pouco mais de uma década antes, reduzindo o poder de compra da população local a
um quinto do que vigorava no seu auge.
O governo do PT repetiu o erro de não poupar no auge do ciclo das
commodities, acreditando que aqueles preços vigorariam para sempre, prolongando o momento de bonança
artificialmente, ao que tudo indica, com objetivos eleitoreiros.
Enquanto isso, outros países mais frugais, como o Chile, aprenderam com a
História, formando robustos fundos de estabilização para serem utilizados nos
anos de vacas magras. Poupar para os anos difíceis é bíblico. José contribuiu
para que o Egito se mantivesse uma grande civilização poupando grãos nos silos.
O governo Dilma-Lula não quis ou não soube aprender com a história das crises
no Brasil, com isso é a população brasileira que precisa ajustar seu consumo de
forma muito mais abrupta do que o necessário, um processo que penaliza, em
especial, a chamada Nova Classe C, parcela da população que recém havia
ascendido a outro patamar de consumo.
O terceiro erro que repetimos foi ter uma política “pró-negócios” e não
“pró-mercados”. Durante o governo militar tivemos um aprofundamento do nosso
capitalismo de compadrio, ou como os americanos chamam crony capitalism. Esse sistema implica beneficiar a classe
empresarial próxima ao governo com empréstimos subsidiados e protecionismo. O
resultado é a má alocação do capital, levando a uma base industrial pouco
competitiva, com baixo crescimento da produtividade do capital e as óbvias consequências
negativas para o crescimento econômico. Como meus compatriotas se lembram,
antes da abertura comercial no inicio dos anos 90 nós dirigíamos carroças. Hoje
temos um parque industrial do setor automotivo com capacidade instalada de
cinco milhões de carros por ano, enquanto o mercado consumidor brasileiro só
tem capacidade para absorver metade disso. O que podemos fazer com o
restante da produção se não somos competitivos, se nossos carros são piores e
mais caros do que os produzidos no exterior e mesmo entre nossos vizinhos? O
que levou empresários a “errar o cálculo” e fazer tão altos investimentos em um
cenário de baixa competitividade? A responsabilidade recai sobre a política
industrial vertical profunda repetida pelo governo que aí está. Eis a “política
dos campeões nacionais”.
O quarto erro no qual reincidimos foi a manutenção de uma política
fiscal frouxa, como no inicio do Plano Real, quando tivemos que pagar caríssimo
para ter uma âncora cambial capaz de estabilizar a inflação. Esta âncora acabou
não se sustentando com a maxidesvalorização de 1999, momento em que o Brasil finalmente
abraçou a responsabilidade fiscal.
Em suma, de uma tacada, o governo atual de Dilma e Lula aplicou à
economia nacional quatro erros graves que já nos levaram à ruína múltiplas
vezes na história. 1. Política monetária irreal e afrouxamento excessivo do crédito
no encilhamento; 2. Não provisão para os dias chuvosos como na década de 1920;
3. Política de privilégio aos “amigos do rei” com benesses em troca de uma
industrialização dirigista, conforme o modelo dos militares; 4. Política fiscal
insustentável como na primeira fase do Plano Real.
Enquanto no tabuleiro político o eclipse dos governos do PT é tratado
por alguns como um momento de reflexão capaz de significar no futuro um divisor
de águas na transparência dos processos políticos e no amadurecimento de nossa
democracia, penso que também na economia podemos discutir como queremos
construir o Brasil daqui para frente. Existem muitos caminhos, mas é hora de
nossa república aprender com a sua história e rechaçar planos oportunistas que
ofereçam algum desses quatro caminhos como solução, em especial, é hora de
rechaçar um governo que promova as quatro propostas simultaneamente.
Cristiane Brasil
Presidente Nacional do PTB